O diploma não é mais obrigatório para que uma pessoa trabalhe como jornalista. Mas será que ele ainda é necessário?
Até o dia 17 de junho de 2009, quem quisesse seguir carreira em jornalismo não tinha muita dúvida do que fazer: era preciso graduar-se em comunicação, nem que fosse para obter o diploma e a carteirinha que a lei exigia. Mas, então, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) atenderam a um recurso, protocolado pelo Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São Paulo (Sertesp) e pelo Ministério Público Federal (MPF), que pedia a extinção da obrigatoriedade do diploma na profissão de jornalista.
A decisão gerou um debate: seria o fim do curso superior de jornalismo? Afinal, em teoria, uma pessoa graduada em qualquer área – ou até mesmo sem formação superior – poderá agora começar carreira nas redações. Ainda é difícil saber o que a decisão do STF muda no dia-a-dia do profissional, mas o Guia do Estudante procurou profissionais de grandes empresas, acadêmicos e estudantes para responder esta pergunta. O resultado é que o curso pode ainda valer a pena, desde que se obedeça algumas condições. Leia abaixo o porquê.
O que as faculdades oferecem?
As faculdades de jornalismo buscam dar ao aluno uma formação que o permita contar histórias sobre qualquer assunto e em qualquer meio de comunicação. O aluno precisa passar, em no mínimo quatro anos, por diversas matérias teóricas, como sociologia, teoria da comunicação, semiótica e princípios éticos do jornalismo, além de aprender os aspectos práticos da profissão em laboratórios de redação, edição, fotojornalismo, rádio, TV e internet. Qualquer formação em uma área específica do jornalismo – como economia, ciência, esportes ou política – deve ser obtida em matérias optativas ou por conta própria. Não é raro que estudantes de comunicação se aventurem a fazer uma segunda faculdade para obter esses conhecimentos.
Com o fim do diploma, argumenta-se que grande parte dessa formação poderia ser encontrada de outras formas. Uma graduação em áreas que não o jornalismo daria ao aluno uma boa quantidade de conhecimento sobre a área em que ele quisesse se especializar, e as disciplinas práticas poderiam ser substituídas pela experiência em redações. Qual seria, nesse novo cenário, o diferencial de uma graduação em jornalismo? “A universidade possui um campo de conhecimento teórico, ético e técnico que não se encontra na redação. O aprendizado é mais intenso e aprofundado”, afirma o professor de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Francisco José Karam, que defende que a faculdade ainda é necessária, nem que seja para dar ao aluno a capacidade de produzir conteúdo sobre qualquer assunto. “A vantagem do jornalista por formação é que seu ponto de partida é aprender a lidar com quaisquer outras áreas de atuação”, diz.
Há, no jornalismo, algo que não é ensinado por outras faculdades?
Sim, e vai desde a ética da profissão até um estilo de texto bastante diferente daquele praticado, por exemplo, por quem faz direito ou filosofia. “Tenho tantos colegas com um texto bom, inteligentes, que falam outras línguas e que não conseguem um emprego na área. Imagina quem não sabe a diferença de um texto escrito para televisão, rádio, revista, jornal ou internet?”, diz a estudante do último ano de Jornalismo da Casper Líbero, Beatriz Côrrea. “Pular o passo da teoria é como abrir o tabuleiro de War, com aquele monte de peças e dados, e tentar jogar sem ter lido as instruções”.
É preciso levar em conta, entretanto, que nem mesmo a faculdade dá conta de ensinar todas as sutilezas do jornalismo. “A universidade desenvolve e lapida o texto, mas não ensina de fato a escrever. Quem tem um texto fraco talvez nunca venha a criar um estilo, mas pode aumentar sua habilidade”, diz o editor-chefe do portal Abril.com, Daniel Tozzi. “O aspecto técnico só será mesmo desenvolvido quando a pessoa for para o mercado. É, aliás, o que acontece na maioria das profissões”.
O mercado vai aceitar pessoas sem diploma?
Sim. A editora de Treinamento da Folha de São Paulo, Ana Estela de Sousa Pinto, afirma que a queda do diploma, na prática, não muda absolutamente nada. “A Folha sempre foi contra o diploma obrigatório, o que não quer dizer que seja contra os cursos nessa área. Cerca de 70% dos nossos profissionais estudaram jornalismo”, diz.
O crescimento do jornalismo pela internet pode até facilitar a entrada de profissionais sem diploma. “Mesmo os mais jovens podem ter conhecimento e experiência na área para levar vantagem, numa seleção, sobre quem tem diploma. Hoje as redações precisam de pessoas que entendam como se relacionar com novas mídias, redes sociais, integrar os veículos em comunidades, etc. Há muitas situações em que não há uma ligação com a vida acadêmica de jornalista”, diz Daniel Tozzi, do Abril.com.
Devo ou não fazer faculdade de jornalismo?
Depende. Todos os entrevistados concordam que ainda existe espaço para os cursos de jornalismo, mas sob certas condições. A primeira delas é que o curso tem que ser bom, o que nem sempre é fácil encontrar. “Um lado bom do fim da obrigatoriedade do diploma é que as faculdades vão ter que reforçar a qualidade do ensino”, diz Francisco Karam, da UFSC. A segunda condição é que, mesmo com o diploma, o jornalista ainda precisará seguir um longo trabalho para continuar melhorar suas habilidades. “Uma faculdade de jornalismo ainda vale, mas só vale se for boa e se o aluno complementar sua formação com muita leitura e interesse pelas áreas em que quer trabalhar”.
Quem, por outro lado, optar por uma formação não-específica em jornalismo, entrará no mercado com uma boa formação no seu campo de interesse, mas precisará se esforçar para adaptar o seu texto ao estilo jornalístico e aprender as técnicas, a teoria e a ética do jornalismo. Isso pode ser obtido de várias maneiras: desde cursos de especialização, a leituras ou estágios em jornalismo. E, qualquer que seja o caminho escolhido, a graduação é só o começo: um jornalista trabalha com informação e, portanto, precisa estudar e se atualizar até o fim da vida.
Fonte: guia do estudante
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